quinta-feira, julho 31, 2008

Por que só o amor não é o suficiente?



Eu te avisei: Vai ser perigoso
e mesmo assim você quis vir...
fomos juntos a um lugar, e a alguns outros....
numa noite, em muitos tempos diferentes, sempre que precisei tu andavas por perto.
saí de casa, encontrei-te por aí e fomos juntos sentir o sol na pele, cheirar o verde das coisas boas - e ambos sorríamos por fora, mas choramos por dentro sempre que estamos juntos.
depois trocamos partes de nós: palavras, sempre...
essas, atravessaram-nos a pele, deixaram há muito de ser só um toque leve entre nós, e permanecem por muito tempo aqui dentro a magoar, a ferir tecidos e sentimentos.
estamos ambos insanos, tão profundamente perdidos em nós mesmos...
e a lucidez, docemente, corrompe-nos por dentro e destrói aquilo que só permanece quando o caos que está comigo...
mas quanto você vai embora (e quando te abandono) perco tudo o que de bom existe...

segunda-feira, julho 07, 2008

"É tão estranho, os bons morrem jovens..assim parece ser quando me lembro de você "....


Houve um poeta
e ele era doce e não sabia amar
e ele era a palavra nua e crua...e a voz de tudo o que doía...e ainda dói

Com o fio da lãmina bem afiada

O exagerado Cazuza, com suas rasantes na poética da paixão dilacerada, rompeu as farpas da fronteira rock/MPB. Em letras de corrosão lupicinica, este Agenor, quase xará de Cartola, sorveu música ao mesmo tempo em que dissipava a vida em noites que nunca tinham fim (Por que a gente é assim?) lá pelos Baixos da vida. Bem Nelson Cavaquinho da geração rocker.

Sempre auto-irônico, realizou a profecia de 'ganhar pra ser carente profissional'. Alguém capaz de explicitar seduções íntimas: 'Há dias planejo impressionar você, mas fiquei sem assunto. Vem comigo, no caminho eu explico'. Um Morrissey de pele dourada pela tropicalidade, à cata de 'um pouquinho de proteção ao maior abandonado, seu corpo com amor ou não, raspas e restos, mentiras sinceras me interessam'. A devastação afetiva, a relação narcísica especular pós moderna, não poderia ter gerado polaróide mais holográfica. 'Se todo alguém que ama, ama pra ser correpondido, se todo alguém que eu amo é como amar a lua inacessível, é que eu não amo ninguém'. Sem arrego, touché monsieur Lacan.

Em parcerias com o constante (Roberto) Frejat, o periódico doublé de letrista e crítico Ezequiel Neves e os demais barões vermelhos (Guto e os ex-integrantes Dé e Maurício Barros), Cazuza despontou como crooner e ponta de lança da classe de 82 do BRock, a da Blitz, do Paralamas, do Kid Abelha, do Magazine e até do Herva Doce.

A misturadeira do tempo já peneirou esses primórdios, o que só fez ressaltar o lastro do nosso Lou Reed de plantão, nos desvãos da saciedade amorosa: 'Ser teu pão, ser tua comida, todo o amor que houver nessa vida, e algum trocado pra dar garantia'.

Em carreira solo, Cazuza aprofundou os sulcos de suas obsessões, ampliou o leque de parcerias (Lobão, Leoni, Gil, Rogério Meanda) servindo-se com freqüência da dialética das antíteses. 'O nosso amor a gente inventa, pra se distrair e quando acaba a gente pensa que ele nunca existiu'. Mesmo no embalo de uma bossa nova, raríssimo caso de hit retardatário na comemoração dos 30 anos do movimento, ele enfia a faca da dor: 'Digo alô a um inimigo, encontro um abrigo no peito do meu traidor'. Faz parte do meu show.

Acossado pela aids, Cazuza, nos últimos discos, afiou ainda mais o fio da lâmina: 'Eu vi a cara da morte e ela estava viva', lanceteou ele no estilete de Boas novas, do álbum Ideologia. 'Se você quiser saber como eu me sinto, vá a um labortório ou num labirinto, seja atropelado por esse trem da morte', vomitou em Cobaias de Deus (em parceria com Angela Rô Rô), no duplo do testamento Burguesia.

Mas o aço da navalha vinha sendo temperado ao longo de toda a carreira. A erosão de Só as mães são felizes, a que cita os pontos cardeais de sua cartilha poética, de Allen Ginsberg a Rimbaud ('você nunca sonhou ser currada por animais, nem transou com cadáveres'), data de 85. É contemporânea da autópsia em corpo vivo de codinome Mal nenhum: 'Não me chamem a polícia, não me chamem o hospício, não, eu não posso causar mal nenhum, a não ser a mim mesmo'.

O poeta terminal, cantor da garganta em chamas e voz sem apuro, sempre exorcizou a própria condição de passageiro da agonia. Quando voltou a lente para as mazelas do país, acionou morteiros no rock enredo Brasil ('mostra a tua cara, quero ver quem paga pra gente ficar assim') ou abriu a metralhadora em O tempo não pára: 'transformam o país inteiro num p..., pois assim se ganha mais dinheiro. Escancarando, sem economizar conseqüências, locutor impune da indignação no país dos seqüestros industrializados. A geração AI-5, comprimida entre o amor livre e a praga da aids, auto-imolou seu mártir a sangue frio.

*texto do jornalista Tárik de Souza publicou na edição do dia 8 de julho de 1990 no Jornal do Brasil*

quarta-feira, julho 02, 2008

"um dia desses, num desses encontros casuais, talvez a gente se encontre, talvez a gente encontre explicação



sabe, às vezes eu gostaria que fosse tudo diferente
que eu não fosse tão egoísta, que apenas o amor me bastasse
mas eu quero mais, e sonho grande e longe...e você...
eu ando passos rápidos, largos...e você não me acompanha, a gente se perde
e eu falo assim, em tom baixo e fora de ordem,
não sigo a linha, o pensamento se perde...
e eu já nem sei mais o que digo


"...porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil"
(Clarice Lispector)

"a cada dia ampliava-se na boca aquele gosto de morangos mofando, verde doentio guardado no fundo escuro de algama gaveta."
(Caio)